Esta história
nasceu com a própria natureza que os meus pais escolheram para viverem, pois
são naturais do Condado da Cornualha, Sul da Inglaterra, região de Saintly
Keverne, lado direito do litoral para quem olhar o mapa do meu país e deparar
com a configuração aparente do salto de uma bota.
Cornualha é
uma longa península que se definha para o Sul da Inglaterra, arrastando-se em
direção do mar Atlântico, tendo contrastes espantosos.
Ver anexos nº 5 do mapa da Cornualha, Inglaterra.
Ora os mansos
campos verdes parecendo tapetes de veludo que nós ingleses chamamos de “Country
side“ ora a costa escarpada transformada por um mar bravio como: End-To-Enders,
ou St. Michael’s, onde o azul do mar chocando-se contra os rochedos
transforma-se em espumantes águas cor de pérola.
Costa linda de
se ver, mas tremendamente perigosa para se banhar.
Povo
hospitaleiro e o mais tranqüilo da Bretanha.
Nasceram nesta
região os meus pais: Jammes e Anne Hosken, e eles me diziam que a história dos
Hoskens tem origem no Condado de Sumerset, cuja capital é BATH, terra de
pecuária e de mineração que absorvem a mão de obra produtiva.
Ainda criança,
saia com meus pais passeando pelas terras encantadas da grande península, vendo
suas belezas, seus mistérios e suas lendas.
A minha região
fica exatamente sobre a “LAY LINE“ que traduzida ao português, quer dizer:
Linha Energizada que corta a Cornualha, Sumerset e vai passar também sobre
Londres.
Meu pai James,
mostrando os dolmens espalhados pelo campo, enfatizava o lado místico e
fascinante como são conhecidas e admiradas as pedras enormes sustentadas por
duas colunas graníticas, como se fossem mesas.
Suas origens
ele não sabia, se de fundo religioso ou significado geográfico, demarcando aquelas terras.
Medindo de
ponta a ponta, 528
quilômetros , ela nasce em LANDS END na costa Oeste
e vai terminar na região de SOUTHEND a Leste da grande ilha.
Os campos
verdes varridos pelos ventos dão ondulações à vegetação, abrindo aos olhos um
fascínio encantador, onde riachos e grutas às vezes feitas pelos homens, os “fougous”
marcam presenças pelo lado místico.
Estes terrenos
há longos anos vem sendo escavados pela arqueologia.
Nas grutas que
infestam o solo, são levadas as crianças
com pneumonia e outras doenças
para receberem os fluidos benfazejos, o que se
tornou tradição.
A mesma coisa
acontecia com as gestantes, quando ali compareciam.
A “Lay-Line“
também é conhecida por: “LAY LINE OF SAINTLY MICHAEL“ e nasce a 9 Mls de
Penzance, junto aos rochedos do mar.
As fontes de
águas cristalinas que nascem nas grutas fazem curas miraculosas, principalmente
em crianças que nelas se banham.
Algumas
pessoas bem informadas, dizem que os dolmens são pedras sepultais e as
“MEN-AN-TOL” pedras em formato de anéis enormes, catalisadores de energia
solar, curando doenças, principalmente a tuberculose.
As
peregrinações nesta região são contínuas, principalmente nos feriados
religiosos.
Segundo fontes
arqueológicas estes monólitos existem há mais de 5.000 anos.
O interessante
é a posição de todos eles em relação ao Sol, sempre voltados a trajetória dos
raios, no sentido Leste a Oeste.
Uma coisa me
intrigava, quando já morando no Brasil, raciocinava como os raios solares
poderiam incidir numa mesma direção ao longo dos 365 dias do ano...
Será que era
verdade o que diziam?
No Brasil,
àquela indagação me atormentava e eu esperava voltar a minha região de infância
para averiguar se o que ouvira era verdade...
Eu teria que
voltar a Cornualha para recordar minha infância e juventude, ver meus pais e
ter respostas as minhas indagações, quando nas praias de minha terra, eu
perguntava:
- O que será
que existe do outro lado do mar Atlântico?
Anos depois,
já do lado de cá, eu estava a assuntar:
- Será que a
costa da Cornualha e especialmente de Lands End, ainda é a mesma com suas
belezas?
E os rituais
dos festivais pagãos, ainda são comemorados?
Eu me lembrava
como olhava encantado à imensidão dos campos.
Ao longe,
paredões de pedras delimitando propriedades com seus quadrados verdejantes e os
rebanhos a pastorear tranqüilos; às vezes a brisa soprada pelo mar desfazendo o
meu penteado.
Nos dias de
Verão, apesar das temperaturas quentes, aquela brisa não permitia o
desconforto, tanto era verdade que as rezes não se escondiam dos raios solares, sob as árvores espalhadas pelo
campo.
Voltando os
olhos para a orla marítima, as escarpas feridas pelas marés altas e tormentas,
mostravam quanto à força da natureza era inclemente com a minha terra.
Alcantis
talhados a pique formavam barreiras intransponíveis a quem quisesse subir ou
descer os rochedos a beira mar.
A costa
inglesa do lado Oeste da ilha é tão selvagem como constatara com as selvas do
Brasil ao aqui chegar.
Se a natureza
ali se expunha daquela forma, havia uma
razão maior para que o CRIADOR a tenha
feito tão bela e quase inaccessível...
Deus escolhera
Cornualha para guardar em seu solo, o símbolo da união de CRISTO com a
humanidade; ali, segundo dizem, está guardado o “CHALICE OF CHRIST - cálice de
Cristo.“
Na data em que
se comemora São Miguel Arcanjo, 28 de setembro, o mosteiro fincado no alto do
monte de “SAINTLY MICHAEL“ fica apinhado de peregrinos vindos de todas as
partes da Inglaterra e do mundo.
Os crentes
tentam chegar o mais próximo possível da relíquia de CRISTO, certos de que ali
está São Miguel, o príncipe dos exércitos
celestiais e com sua presença, também está Cristo vivo, como estava no
dia da Ceia do Senhor.
Nas
peregrinações que fazíamos ao santuário, com Samuel e Thomas Hosken, íamos
acompanhados de nossos vizinhos e amigos: Os Trevanians, Poldarks e Clowances.
Meu pai Jammes me contara que
desde menino, visitava Sainty Michael
com o avô, Thomas Hosken Junior e o meu bisavô Thomas Hosken Pai.
Durante as noites que
passávamos acampados, uma multidão de fogueiras
iluminava todo o litoral, transformado num colar chamejante de
luzes.
Incompreensível a uma festa
religiosa, as danças ao redor das fogueiras
especialmente quadrilhas, que davam um sentido estranho às comemorações...
Quando visitei
St. Michael’s pela última vez, Mary estava comigo e o Outono entrara em seus
primeiros dias de frio, anunciando o Inverno.
Durante as
tardes andávamos pelas estradas de terra da baixada, admirando as propriedades
divididas simetricamente nas formas geométricas de quadrados, retângulos e
losangos.
À noite, sob o
calor ardente das fogueiras, no alto do monte, ficávamos juntos para aquecermos e comermos o que de casa
trazíamos.
Como eu me
sentia bem, tão perto de Mary!
Ao passar por
nós os cordões de pessoas pulando e cantando, eramos arrastados pelo turbilhão
e Mary se atrelava a mim, engrossando o rosário de figurantes naquela dança
ingênua, mas profundamente profana.
- Venham
esquentar!
Esquentar
como, se o vento sibilava fazendo-nos arrepiar?
- Venham! Repetiam eles, agarrando as nossas mãos.
De vez em
quando escapávamos do turbilhão e levados pelo encantamento do lugar e da
festa, fugíamos correndo descalços pela orla da praia.
Como era
gostoso correr com os pés nus sobre a areia e a favor do vento! Enlevado pelos sentimentos, eu tentava
agarrar Mary em meus braços; tendo somente as estrelas como testemunhas...
O medo de
minha ousadia despertava sua prudência e conscientemente obrigava-me a voltar
junto dos demais no acampamento.
Sentindo
frustrado, reconhecia que ela tinha mais juízo do que eu e me rendia aos seus
apelos.
De mãos dadas
íamos desviando das marolas que as ondas faziam lambendo a praia; o
encantamento desaparecia sufocado pela multidão de gente embalada pelas
músicas.
Os sons dos
violinos e das gaitas de fole chegavam aos nossos ouvidos excitando-me ainda
mais.
Por Deus! Eu
me sentia tão humano como os outros e minha masculinidade não queria obedecer à
razão...
- Mary! Mary!
ela se afastando de mim como se afastasse de um
ferro em brasa...
Somente a 200 metros das
fogueiras, ela parou a minha espera.
Ali ela se
encheu de coragem, para estender suas mãos; meu coração batia descompassado,
não pela corrida, mas pelo corpo que se encostava ao meu...
A vontade era
imensa de alisá-lo, mas o atrevimento seria o fim do meu deleite...
Segurando-a
com mais força, eu temia perdê-la, ela reclamava com meu gesto desvairado:
- Está doendo,
Edward!
- Perdão Mary,
eu não quero magoá-la, nem tão pouco perdê-la...
Contra a
claridade que vinha das fogueiras, sua silhueta estampava aureolada pelo fulgor
das chamas.
Como era
bonita!
Imagem que
nunca mais se apagou da minha memória, e às vezes reativada quando no Brasil
anos depois, eu assistia as festas religiosas consagradas aos santos do mês de
junho: Santo Antônio, São João, São Pedro e São Paulo.
As chamas das fogueiras
e o seu calor são semelhantes, basta que tenhamos: olhos e coração abertos para
senti-las.
Esta história,
é cinza de fogueiras que arderam um dia e que permanecerão ardentes através da
percepção de meus filhos, netos, bisnetos, trinetos, tetranetos, pentanetos e hexanetos
O vento se
incumbirá de espalhá-las até suas vindas...
Afastando-me
da Inglaterra, eu perdi Mary, porém Deus me deu Maria Magdalena.
Aquele vento
que maltratara a tez de Mary em Lands`End, jogando areia em seu rosto, também
me maltratara, pois me feriu por muitos anos.
Recordando do
mar que me fascinava, lembrava também da imagem que nunca mais se apagou, pois
foram duas coisas que perdi ao mesmo tempo...
Ela, minha
primeira namorada e o mar batendo espumante nas pedras de Lands End.
Naquele último
passeio ela vestia a moda dominante da época, um traje regência e por baixo,
certamente a lingeries Gossard e o sutiã de suporte em elevação que fazia
aumentar a opulência dos seios.
Ao contrário
das outras moças, ela até então fugira aos cachos em tranças.
Seu rosto
queimado pelo Sol mostrava as maçãs vermelhas e o seu sorriso inconfundível se
abrindo a mais doce paisagem de minha terra.
Os campos de
Lands End estavam salpicados de manchas; de longe, era impossível divisar se de
reses ou dolmens, o espírito do Saint Grail estava ali presente, eu sentia.
( Saint Grail, em inglês, é o
mesmo que: Cálice de Cristo usado na Ceia dos Apóstolos)
Inconformado
eu perguntava a mim mesmo: Se o espírito de Deus estava tão próximo, qual a
razão das lutas religiosas que provocavam o afastamento de irmãos na
Inglaterra?
A intolerância
religiosa em minha terra era terrível com seus preconceitos, pouco importando
que a crença do vaso de esmeraldas que teria servido JESUS CRISTO na ceia com os discípulos, estivesse guardado
ali tão perto.
O sacrário da
Cornualha guardava também o meu coração...
Eu poderia
iniciar esta história por volta do ano de 1.086, quando apareceram nos
registros de Domesday na Inglaterra, os nomes dos primeiros antepassados com o
sobrenome HOSKEN; ou pelo naufrágio dos navios: HECTOR - DOVE e o RAMBLER, no
Atlântico, todos eles transportando membros da nossa conceituada família de
origem Anglo-saxão.
Se a proeminência de uma família ganha mais
projeção ao afastar dos séculos de suas origens, então para vaidade dos HOSKENS
retrocedemos ao ano de 1.066, onde no Museu britânico vamos encontrar
registrado pelos monges, o sobrenome HOSKEN, o que significa que já existia
esta nossa família antes do século XI.
Talvez em
busca da origem, em vez de HOSKEN, vamos encontrar variações como: HOSKIN,
HOSKYNE, HASKINE, HASKYNS, tal qual aconteceu durante certo tempo no Brasil,
onde a ignorância de muitos cartórios, eliminara a consoante “H“ da inicial do
nosso sobrenome.
O fato é tão
verdadeiro que: Ao ingressar o autor deste livro no grupo escolar de sua terra,
no registro de inscrição escolar do ano de 1.933, seu sobrenome foi inscrito
como:
“OSKEN”
Censura-se a
inteligência e o bom senso de algumas pessoas do passado, deturpando a grafia
original que é uma marca indelével; ao contrário enalteço a Igreja que fiel ao
respeito das famílias de origem, grafava os sobrenomes certos, respeitando a
vontade dos pais ou dos padrinhos.
Foi na busca
dos arquivos episcopais que encontrei a base para formular esta história e ela
foi amadurecendo na medida em que, aprofundava nas pesquisas.
Por fatores
familiares e sociais, a história do aventureiro EDWARD HOSKEN, ficou encoberta
por 100 longos anos após sua morte em CATAS ALTAS DO MATO DENTRO.
Se por
deslizes pessoais de seus descendentes ele ficou esquecido por duas gerações
consecutivas, a terceira geração da qual me incluo, tem a obrigação de
ressuscitá-lo...
É a isto que
me proponho nesta aventura inicialmente tão escassa de informações, mas que
foram surgindo a medida que aprofundava nas nuanças do romance e proezas da sua
vida...
Na primavera
do ano de 1.833, no Sudeste da Inglaterra, sob o reinado da rainha Vitória
residia em St. Keverne
o casal James e Anne Hosken, educados nos princípios rígidos da religião
Anglicana.
Família de
tradições mineradoras, mas de cujo passado guardavam tradições de nobreza e
fidalguia.
St. Keverne no
Condado de Cornualha onde residiam, fica no extremo Sudeste da península, sob o
paralelo 50 e a l4 km. do cabo Lizard, entre os meridianos 4 e 6.
Ver mapa do Sul da Cornualha,
Inglaterra no anexo nº 6.
A península
avançando sobre o Atlântico é assolada por ventos vindos do Mar do Norte e
também pela corrente marítima do Golfo do México, que nos contrastes das
temperaturas, ameniza o clima da Cornualha.
A vida pacata
da família HOSKEN em St.
Keverne depois da volta de Jammes do Brasil, não coadunava ao
do filho cheio de aspirações e de desejos de aventuras; ainda mais, faltava
trabalho aos jovens da sua idade.
Sua
perspectiva profissional era limitada, ele também sabia que dificilmente
galgaria as mais altas posições gerenciais de uma mina, posto de
Comissário por exemplo como todos os
jovens aspiravam.
Apesar de
James Hosking ser assistente de diretor, como também o era Edward Hosking na
Mina de Breage, por cima deles havia outros com mais direitos.
As dificuldades
de emprego eram reais naqueles primeiros anos da década de l.830, tanto era
verdade, que Samuel, Thomas, Diogo e John meus familiares, haviam abandonado a
Cornualha para irem trabalhar no Brasil.
O sonho de
Edward era conhecer outras terras e mares, como fizeram os Hoskens seus
parentes influenciados pelo pai que lá estivera até 1.832.
Não podendo ainda
satisfazer seus anseios, iam nas tardes de folga olhar o mar azul que sumia no
infinito.
Quando só,
ficava a pensar: O que existiria do outro lado do Atlântico?
Como seria a
vida dos Hoskens que haviam emigrado para o Brasil?
As cartas de
seus familiares confirmavam tudo que o pai dizia sobre o Brasil e vinham cheias
de admiração, pois lá parecia haver uma
só Estação...
Um dia ele
iria saber, custasse o que custasse seu sonhar, pois pretendia fazer a mesma
coisa que Samuel, Mary, Thomas, Diogo e
John, fizeram.
E a mãe Anne,
permitiria a realização do seu sonho?
Do pai
receberia no princípio talvez um não, mas depois, com má vontade compreenderia
suas aspirações e cederia como acontecera com os que se foram...
Naquela época
a TRADE UNION, fundada para defender interesses da classe trabalhadora, estava
convocando mão de obra especializada para assumir os lugares dos mineradores da
Imperial Brazilian Mining Association, que estavam no Brasil desde 1.828 e não
reformariam o contrato de cinco anos.
No anúncio dos
jornais e nos escritórios das minas existentes, a IMPERIAL BRAZILIAN MINING
ASSOCIATION, juntamente com a Trade Union, oferecia empregos garantidos a quem
se dispusesse a trabalhar no Brasil por um contrato pré-estabelecido de 5 anos
de atividades consecutivas, era a 2a. turma nesta forma de contrato.
Era o que o
jovem Edward agora com 20 anos desejava, as cartas que recebia de Samuel e Thomas
já radicados no Brasil, excitava-o.
A proposta era
tentadora, pagaria a pena sondar pessoas mais bem informadas e experientes, se
ele daria conta do que ofereciam.
Em segredo ele
tomaria as primeiras informações para que sua mãe não obstasse os seus planos,
pois ela fora inteiramente contra a ida do pai e de outros parentes que por lá
passaram.
Sabendo que em
FALMOUTH tinha um velho parente marinheiro, que viajara pelo mundo inteiro e
que por ocasião da Independência do Brasil, engajara-se na esquadra do
almirante Cockrane, para lá partiu esperançoso.
O tal
marinheiro só tinha elogios pelo país, além da simpatia que teve por ele nas
lutas de sua emancipação; a beleza da terra e de seu povo, o clima, a fartura
de víveres e frutas, deixaram o jovem maravilhado.
Seu
conhecimento restringia-se às cidades onde aportara no litoral, mas que
deixaram saudades.
-E as
mulheres, perguntou Edward?
-Todos os
tipos que você desejar...
- Como assim?
- Brancas,
mulatas, pretas e até índias se você quiser.
-Não, não é a
isto que quero saber; eu pergunto como são elas?
-Ah! Mulheres
lindas, meigas, sobretudo, fêmeas...
No sul e no
centro, maior quantidade de brancas amorenadas pelo Sol, no Nordeste onde fora
a capital da colônia, grande quantidade de pretas e mulatas de uma brejeirice
encantadora.
- Por que você
quer saber tanta coisa sobre o Brasil?
Pensei que
você veio aqui para nos visitar e matar a saudade, agora vem com esta enxurrada
de perguntas por uma terra tão distante...
- É verdade,
eu quero saber tudo sobre o Brasil, há ofertas de emprego para quem tiver
experiências na mineração, isto mexeu comigo...
- Não é possível! Você ficou maluco?
- Não, claro
que não, é uma oportunidade única que surgiu para um sonho que acalento desde
menino, quando meu pai esteve no Brasil na década passada.
- Sua
experiência em mina ainda é pequena, a não ser que esteja disposto a enfrentar
a dureza do aprendizado.
- O tanto que
conheço sobre mineração já me basta e seja o que DEUS quiser...
- Olha o que
você está aprontando, menino!
E a namorada
que você me apresentou, vai ficar para trás?
- Brigamos e
senti que não há retorno...
-Como assim?
-
Incompreensões, além do medo que demonstrou de ter que ir para o Brasil.
Edward
silenciou sobre o assunto e desviou a conversa.
Onde você
passou a maior parte de sua estadia no Brasil?
- No mar...
-Como no mar?
- Não se
esqueça que eu era marinheiro e a minha casa, a Corveta Maria da Glória...
- Então você
se engajou na marinha brasileira?
- Quase,
servíamos ao almirante Cockrane, que por sua vez, fora contratado para
organizar a nascente marinha do Brasil para as lutas de sua independência.
Em Falmouth
passei aquele dia, no outro voltei à minha casa.
Ainda havia em
mim aquela dúvida e o receio das loucuras que era viajar para o desconhecido.
Se a
transferência para o Brasil estava dando certo para os familiares que lá
estavam, por que não daria certo para ele?
No sábado,
encontrando na saída do templo com o amigo da família, senhor WILLIAN JEFERRE e
sua esposa ANNE RAILTEW JEFERRE, que haviam se casado no Brasil eles
abordaram-me dizendo:
- Como foi bom
encontrá-lo, avisa aos seus pais que por um destes dias passarei por lá para
despedirmos e saber se precisam enviar alguma coisa para os seus...
Despedirem-se!
Para onde vão?
- Para o Brasil,
Edward!
- Prá onde?
- Estamos
voltando para o Brasil, pois fui chamado para trabalhar novamente em outra mina
de ouro daquele país.
Em qual mina?
Do Gongo Soco,
recém-comprada pela Brasilian Mining.
Parecendo
maluco, ele disse admirado para os Jeferres:
- Não, não é
possível!
- Ora! Não é
possível por quê?
Rindo com os
dentes bem a mostra, Edward surpreendia aos amigos.
-É
incrível! Eu também penso em ir juntar
aos meus familiares que estão trabalhando lá, na mesma mina onde meu pai esteve
até agosto de 1.832.
- Jammes e
Anne mudaram de idéia e permitiram que você partisse?
- Eles ainda
não sabem, mas não haverá objeções, pois completarei 20 anos.
Mal sabia
Edward que ele, naquele encontro estava ganhando os futuros pais para os anos
seguintes da sua vida, pois depois que os parentes encerrassem o contrato de
cinco anos, voltaria à Inglaterra, Willian e Anne seriam os amparos dele
naquela terra estranha.
Anne era
apenas 11 anos mais velha do que Edward, porém tinha por ele um afeto especial,
os pais trabalhavam juntos há vários anos e eram além do mais, vizinhos.
Anne chamava a
atenção pela beleza física de suas formas e pelos longos cabelos loiros caídos
sobre as costas.
Seus olhos
azuis davam maior serenidade ao seu semblante e o seu sorriso franco, uma porta
aberta para quem dela se aproximasse.
Já o esposo
JEFERRE de olhos verdes, mantinha os dentes escondidos por trás dos lábios,
nunca os mostrando, mesmo nos momentos de alegria; era seu modo particular de
ser apesar da afabilidade que demonstrava nos seus momentos sociais.
Anne ainda
surpresa com a conversa da ida do jovem amigo Edward, perguntou:
- Você vai
partir daqui solteiro?
-Sim é lógico,
ainda sou muito novo para casar; quando voltar do Brasil é que vou escolher a
minha companheira...
- Pense no que
você está aprontando, menino!
Eu e Jeferre
somos casados e companheiros para todas as vicissitudes que nos ocorrerem; e
você, á quem pedirá socorro?
Ora!
Certamente a Samuel e sua esposa Mary ou a Thomas e Adélia, meus familiares.
Edward
ignorava que seus parentes estavam voltando para a Inglaterra.
- Vocês também
não estarão lá?
Edward sorria.
- Sim é claro,
mas nós nunca iremos substituir seus pais...
Willian
Jeferre com aquela conversa ficara preocupado, sabendo que o jovem amigo tomava
aquele rumo levado por sentimentos amorosos, ao contrário deles que tinham um
ao outro para se amparar.
-Que você acha
desta loucura, Anne?
- E a nossa
ida, também, não é?
- Ora, Anne!
Nós somos um casal adulto e experiente e não estamos viajando por decepções amorosas!!!
- Então foi a
Mary que provocou a viagem do Hosken?
- Foram
desencontros dos dois, solapado pelo orgulho dos pais dela que se julgam
superiores em tudo a nós mineiros...
Pense bem! A
Mary encontraria por aqui um jovem tão bonito e trabalhador como ele?
-Tão bonito;
certamente que não, porém mais realizado financeiramente, talvez sim.
O menino é
novo, ambicioso e aventureiro, terá certamente um futuro promissor.
- É, mas aqui
ele não teria esta perspectiva de vida que certamente terá na América.
-Você imagine
este garoto voltando rico, como ficariam os pais de Mary?
- Ah! Com
caras de tachos esquentado nos fundilhos, vermelho e embaçado depois de tanta fumaça.
-Não seja tão
crítica com eles, querida!
Eu no lugar de
James e Anne, não permitiria a viagem de mais um filho nas circunstâncias dele
e se por ventura eles pedirem o meu conselho, serei sincero
desaconselhando-os...
Nós não temos
o direito de interferir na vida particular deles; por certo eles também devem
achar que somos um casal de loucos...
Willian e Anne
ainda teriam algum tempo pela frente, o tempo suficiente para venderem o
mobiliário e os seus pertences.
Do enxoval
pessoal, pouca coisa aproveitaria para levar; a mineradora recomendava roupas
pessoais leves, condizentes com a região tropical para onde iam.
Para os
homens, a contratante forneceria a maior parte das roupas de trabalho, somente
os trajes sociais é que deveriam levar.
Com esta
providência, a empresa eliminava o excesso de bagagens.
Durante o
recrutamento houve uma preferência que colocou Edward em dúvida:
A Brasilian
dava primazia aos casais com filhos em condições de trabalho, como foi o caso
de Samuel e Mary e Thomas e Adélia que já tinha seguido há mais anos.
Por último os
solteiros acima de 20 anos.
Ele Edward
estava com 19 anos e completaria os 20 pouco tempo antes da viagem.
Será que a
sorte iria premia-lo entre os 120? Ele
filho de Jammes Hosken!
Os que fossem
escolhidos seriam embarcados em levas de 40 pessoas no período entre a
Primavera e o Outono europeu, o que correspondia ao período de secas no Brasil.
Nas primeiras
viagens seriam incluídos os contratados que tivessem conhecimento de
construções, nas últimas o pessoal habilitado com a mineração.
Edward depois
de obtida a autorização dos pais, apresentou-se à Mineradora para informar-se
de maiores detalhes.
Seu nome
constava da quarta leva, juntamente com Mr. Jeferre e a esposa, o que se daria
no mês de junho, Verão no continente europeu.
Em maio ele
teria que se apresentar à empresa para receber instruções durante todo o
decorrer dos 31 dias e ao mesmo tempo, preparar os documentos necessários como
emigrante.
Os dias voavam e maio veio logo com as instruções que tomavam todo o
seu tempo.
Edward receoso pelas lições que teria que guardar prestava a maior
atenção às instruções que recebia de pessoas que já haviam trabalhado na
América e África.
Eram explicações para sobrevivência numa terra ainda pouco desbravada,
lições superficiais sobre a língua portuguesa, hábitos, religião, clima, moeda
e os males que poderiam ocorrer, tanto na viagem quanto ao decorrer do
contrato.
Dados importantes para todos, inclusive as crianças que também
seguiriam, conscientizando-os dos perigos que enfrentariam em terra e povo
estranho.
Eles os ingleses, seriam uma minoria dentro da própria mina, apesar do
contingente somar 200 patrícios contra os 900 brasileiros previstos.
As esposas receberiam ensinamentos especiais sobre alimentação,
primeiros socorros em caso de necessidade, mesmo sabendo que com eles seguiria
um médico.
Lá, explicavam eles: - Vocês terão moradia, alimentação, vestes de
trabalho, escola, hospital, templo religioso e áreas próprias de lazer.
De tempo em tempo, mala direta da Inglaterra e vice-versa para o
Brasil.
Na mina do Gongo-Soco, este é o nome do lugar onde vão trabalhar e
viver, construímos uma vila com todas as condições necessárias para
sentirem-se em casa.
A dificuldade maior que vocês sentirão é com o relacionamento com os
nativos da região; chamamos de nativos os brancos e os escravos já radicados
naquele local.
A empresa oferecerá uma vez por semana, aulas de conversação na língua
local, o português.
Durante o período de adaptação e aprendizado da língua portuguesa,
vocês deverão evitar falarem com os escravos; trata-se de medida preventiva
para que vocês não se compliquem com os
dialetos dos negros.
-
Então, eles não falam a mesma língua, perguntou um dos mineradores?
-
Não, pois são africanos e misturam o banto com o português...
-
Há muitos negros na mina?
-
No Brasil o trabalho pesado é todo feio pelos negros, não é como na Inglaterra,
onde não existe escravatura...
-
Então a maioria operária será de negros?
-
Claro! Pois a Cia. não pode dispor de tantos europeus para trabalhos
braçais
em terras tão distantes...
-
Tal como nas minerações da África do Sul, vamos utilizar mão de obra
pesada de
nativos africanos, já que no Brasil os seus nativos não se prestam ao trabalho
submisso.
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