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CAPÍTULO XIII -A LUA DE MEL


As noites na casa dos ingleses no Morro da Água Quente eram calmas e sossegadas para o casal Edward e Magdalena.
Eles esperavam John dormir para saírem pelas proximidades da pracinha.
Andando de mãos dadas sob a luz do luar, conversando especialmente  sobre a vida deles.
Edward sabia quase tudo sobre o passado da esposa, pois a família dela guardava tradições que eram conhecidas por todo mundo na localidade.
Já, sua vida pessoal pouca coisa era sabida.
Magdalena tornara-se interessada não só por sua vida, mas também queria saber como era a terra do esposo, seus hábitos e costumes.
- Você Edward, sabe tudo sobre minha vida, já a sua, e dos seus familiares e da Inglaterra, desconheço por completo.
- Não  fácil para estrangeiro contar vida sua outra língua,  Magdalena!
- Eu sei que não deve ser fácil, mas você já fala razoavelmente o português e   nunca me contou histórias de sua família, sua terra e seus costumes.
- Ah! Eu conto você!                                            
 “Minha terra Magdalena, é Minas Gerais; Inglaterra, só  mais plana,  verdes campos e não  serras e matas como aqui.
Minas centro Brasil, Cornualha é sul Inglaterra.
Aqui riqueza solo é ferro, ouro e pedras cor, lá a hulha negra.
Casas Brasil e Minas, feitas adobes de barro, minha terra, tudo pedra.
Brasileiro com muitas matas, não fazer jardim casas, lá toda casa rodeada de jardins gramados.
Não casa Inglaterra sem verde, seja jardins ou  paredes cobertas pelas heras.
Como inglês pensa ser Lorde, todas casas campo, tem  parte alta que brasileiro chama (tower)  para domínar visão, seu proprietário.
 Nas telhados mora  mochos caçadores  ratos e pragas  lavouras.
- Que vocês chamam de mochos?
- É ave, coruja brasileira.
Aqui, casarões construídos madeira e barro desmoronar feios,  ruínas com  tempo, lá fica muitos, muitos anos, pois ingleses faz casa  de pedra...
Casas de campo, ficar sempre meio de terreno geométrico, formado por quadrados, retângulos e losângos divididos por muros pedras e plantas vivas.
É bonito ver alto o desenho que fazer os terrenos cores diferentes verdes, onde estradas batidas terra, separar como fita na cor ocre.
Enquanto Edward falava sobre sua terra, Magdalena ficava livre de seus impulsos amorosos e ela dava corda para que ele ficasse preso as suas lembranças.
Foi num daqueles passeios a noite, que esgotadas as recordações, Edward gaguejando teve a audácia de perguntar à esposa se as mulheres  da sociedade brasileira eram feitas de pedra.
- Por que Edward?
- Você, mulher brasileira tem coisas que eu não saber!
- Como assim?
- Nós casados muitas dias e Magdalena não quer eu juntar mais perto!
O que pensar minha mulher, querida?
- Eu tenho medo de estar em pecado, Edward!
- É pecado homem e mulher casado amar, Magdalena!
Eu duvidar nos casados perante lei e olhar de Deus!
A maneira envolvente como falava e o carinho como ele a seduzia, acabou envolvendo-a ao desejo irrefreável dele...
Ela estava receptiva ao que mais desejava e as coisas acabaram acontecendo sob a luz das estrelas que iluminavam o céu, numa noite clara...
Sentados sobre as pedras claras junto do riacho ela se deixou levar pela continência de ambos.
Perdendo a noção onde estavam na sombra da noite, nem a lua que nascia poderia desviar a atenção deles, tão envolvidos na ânsia de seus desejos até então refreados...
Um explodir arrebatador chegara antes que ela sentisse a violação; beijando-a ela ouvia as palavras mais doces que poderia escutar:
- I want you so much, darling!
Não só ele queria, ela também esperara por tanto tempo o que refreara até então para tormento de seus escrúpulos...
Ela completamente inocente, pensara que se fizera mulher com aquele calor e o explodir de ambos.
Uma professora do colégio onde estudara, numa certa aula explicara que a maternidade vinha através do contato dos corpos do homem e da mulher.
O eufemismo para quem ignorava a reprodução, bastara no entender  da menina pura e casta, que ela se tornara mulher...
Já Edward pedia desculpas e ela achara que tudo se consumara sem que ela tivesse sentido o prazer como ele sentira...
Os mesmos vaga-lumes e grilos que povoavam as noites do Gongo Soco, quando ele e Antônia saiam a passear pelo acampamento da Mina, pareciam a Edward estarem ali para testemunharem um ato de que se sentia envergonhado...
Os mesmos sons das águas borbulhantes e em queda do riacho do Gongo...
Ao voltarem, muitos dos moradores do povoado já dormiam apenas animais vadios perambulavam pelo adro.
Só mesmo os amantes ainda estavam acordados, pois ao alvor da madrugada, os que mineravam teriam que estar despertos para a cata do ouro.
O menino John gozava suas férias escolares junto com o pai e a nova mãe que ele arranjara.
Genoveva reclamava que ele só dava atenção à Magdalena, esquecendo-se que antes ele atormentava o dia inteiro...

As minas a céu aberto estavam produzindo bem, mais dadivosas do que esperavam os ingleses.
O Comissário Mr. G. V. Duval exultava com os resultados da mineração da região do Caraça como ele designava em seus relatórios.
O gerenciamento de Mr. Yory seu subalterno correspondia ao que se esperava de sua administração nas catas junto da serra.
Mr. Duval ficara surpreso com o casamento de Edward Hosken e  a moça daquela região, pois ele chegara a  manifestar desejos de voltar à Inglaterra.
Raro eram os ingleses que se casavam com brasileiras, mas as moças daquela região deviam ter um visgo, pois era o terceiro patrício que se casava de papel passado em Catas Altas.
Será que os ingleses estavam perdendo o juízo na sua maneira de pensar?
A má fama, especialmente dos nascidos na Cornualha, iria acabar com tantos casamentos que estavam ocorrendo no Brasil?
Na Inglaterra o conceito de aventureiros e baderneiros dava uma  fama de parias aos anglos-xasões...
De origem germânica, região do Reno, os Saxões chegaram à Inglaterra levados pelos generais comandantes: Hengist e Horsa.
Desembarcados no Sul Este, espalharam-se dominando o condado de Kent e chegaram a Oeste e a Norte da Bretanha.
A força conquistadora dos aventureiros deixara marcas nas gerações posteriores que se implantaram no sul da Inglaterra.
Apesar das inúmeras invasões ocorridas na ilha britânica, desde os Fenícios,  os saxões foram os que deixaram maior influência na formação de seu povo.
Os brasileiros que passaram a conviver com os homens do Gongo Soco, sentiam o orgulho e a autoridade própria da raça de suas origens.
Foi com as qualidades e defeitos deste povo, que Magdalena passara a conviver
Integrando-se a colônia inglesa e passando a maior parte das horas do dia, junto das senhoras inglesas, ela aprendeu a difícil tarefa como estranha no ninho, ser uma perfeita “LADYSHIP” Assimilando os modos de John, com quem convivia, aprendia a conhecer também o marido que trabalhava l3 horas nas extrações das minas.
John sentia que tudo que perdera com a morte de Anne Jeferre, sua mãe de criação, voltara a desfrutar com o zelo da madastra, a terceira mãe  em sua vida.
Nos dias que passara no Morro d’Água Quente, procurara afastar seu pensamento tudo que lhe ocorrera.
Por que padre Francisco não quis dar a bênção nupcial?
Logo ela tão sua amiga e que o ajudava em todos os seus pedidos!
As novidades da vida de esposa e de dona do lar, arrumando a casa e acabando pequenas coisas do seu enxoval, tomava todo o seu tempo.
Quando só, uma nostalgia invadia  seus pensamentos.
 Saudade dos pais, dos irmãos de suas coisas dentro da casa  onde nascera.
Não adiantava querer afastar um sentimento enraizado que nem os animais esqueciam.
Quando se lembrava da escola onde dava suas aulas, ficava triste de ter se afastado daquela ocupação que lhe dava prazer.
Ela começou a sentir medo de perder em definitivo o gosto de lecionar.
Para preencher as horas de sua solidão dentro de casa, pediu licença à Edward para visitar as famílias dos mineradores do Morro d’Água Quente.
Com a autorização do esposo, saia com Genoveva percorrendo o acampamento, dando conselhos alimentares e de higiene as mães necessitadas.
Missionária levando socorro e lenitivo aos doentes, purgava seus pecados, que para sua consciência eram grandes demais.
Nos poucos dias que permaneceu em Água Quente granjeara simpatias que anos depois, transformaram-se em sólidas amizades.
A menina Aparecida era sua guia, visitando as casas do lugarejo e as pessoas que ela apresentavA retribuição de seus cuidados e o interesse
Às pessoas que ela deu apoio, começaram a bater em sua porta, trazendo prendas pra Nha Magdalena.
Frutas, hortaliças, ovos e aves, chegavam às suas mãos.
Constrangida, pedia que retribuíssem o seu carinho apenas com orações e amizade, pois era tudo que precisava.
A demonstração de afeto daquela gente era patente através das crianças; bastava sair de casa para arregimentar meninos que nunca vira.
Nos primeiros dias era chamada de “Muié do Godeme” depois Sá Magdalena e finalmente Nha Magdalena.
O lugar apesar de triste e pobre como a maioria das localidades de mineração, era acolhedor.
No pouco tempo que estivera ali, socorrera acidentados do garimpo, inclusive um que ficara soterrado por um barranco de grupiara.
Ela e Genoveva cuidaram de limpar a vítima e curar as feridas abertas; Gemendo de dor com a limpeza de água salgada, cobriram as escoriações com folhas de “Bela-Margarida“ que na região são geralmente conhecidas por boninas.
Planta muito usada na cura de feridas, pois é vulnerária.
Edward não via com os mesmos olhos samaritanos de Magdalena a caridade que ela fazia.     
Segundo a sua mentalidade, havia pessoas para atender aos diversos níveis sociais, e aquele que Magdalena estava percorrendo, não era o deles.
O pequeno espaço de tempo que passaram no Morro, pelo menos fizera que ela esquecesse o drama do seu casamento da maneira que fora.
Em Catas Altas a notícia do casamento correra como fogo alastrando morro acima; ninguém poderia imaginar que Magdalena contrairia a vontade do Guarda-Mor.
A carta deixada por ela aos pais, explicava sua atitude; sabia da tristeza que causaria a eles e por isto pedia perdão por magoá-los.
Prometia que passada a tormenta, voltaria como o filho pródigo.
No fim da carta escrevera:
- Não se sintam ofendidos e mais pobres por perder uma filha, pois prometo torná-los mais ricos com o novo filho que conquistarei  para os senhores...
Os olhos de dona Rita se encheram de lágrimas e revolta ao tomar conhecimento da carta.
O fato estava consumado, nada mais poderia fazer...
No seu modo de pensar, o marido fora culpado pela intransigência ao casamento com o inglês, Magdalena chegara a clamar contra a objeção deles.
Não suportando ao disse-que-disse, o Guarda-Mor e a esposa foram passar uns dias no retiro da Bonifácia, certos que a filha e o inglês tinham ido para Gongo-Soco.
Lá estavam a salvo dos comentários e da dor de uma  ferida aberta...
O arraial não esqueceria o fato e para muitos o Inglês era sem dúvida, um vilão;
“Demo ante-Cristo,”, pois não professava a religião católica...

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Há duas semanas Edward e Magdalena estavam morando na Vila do Gongo Soco; ambiente completamente estranho à ela,  mas  da  intimidade do marido,
As residências da vila inglesa, instaladas na encosta do morro, e junto ao leito do riacho do Gongo, tinham um encanto especial para Magdalena
Simples, porém bem construídas em estruturas modernas para o padrão da época, Magdalena se sentia como se estivesse numa vila européia, tal como descrevia Edward quando falava sobre sua terra.
As residências realçavam especialmente pela pintura das paredes externas na cor Oxido de Ferro, tal qual o minério de canga da região, porém as esquadrias brancas davam uma mágica aparência ao conjunto, rodeado por gramados.
O verde e as cercas brancas vistas do alto do Morro davam a quem via nítida impressão de uma autentica vila inglesa.
Junto das casas da vila: A igreja, a escola e o hospital e mais afastada a residência do administrador, com seus quintais, currais e cobertas.
A estrada correndo paralela ao rio Congo até certo ponto depois uma ponte cruzava o caminho sobre o rio que descia encachoeirado.
O prédio do hospital de inúmeras janelas, construído em duas alas; separando as enfermarias e salas da administração e enfermagem, da cozinha, refeitório e lavanderia.
A primeira impressão de Magdalena foi de encantamento com a nova vila, completamente diferente da barroca, Catas Altas.
A ordem como regia a vida dos moradores, a severidade do controle do portão da vila e nenhuma pessoa na janela das casinhas, mostrava como eram ocupadas e determinadas em seus afazeres.
Fosse a sua terra, ao chegarem estariam as janelas ocupadas por olhares indiscretos e alguém perguntando quem eram  e de onde vinham.
Já anoitecendo, as primeiras pessoas que vieram dar boas vindas ao casal, foram:
Mr. Gooddair, o missionário, o médico Dr. Cuming e o comissário geral Mr. Duval.
Magdalena recebeu das mãos do Dr. Cuming um formulário que deveria ser preenchido por ela, onde constava:
Nome de nascimento, filiação, escolaridade, doenças sofridas, vacinações e até o que gostaria de fazer nas horas vagas do dia a dia.
Não acostumada aos hábitos dos estrangeiros que vinham para o  Brasil, achou que estavam imiscuindo em sua vida particular e ficara sem saber se devia ou não responder a certas perguntas.
Edward teve que explicar que era uma rotina a todos os emigrados que chegavam ao país e que a Companhia Mineradora procedia da mesma forma  com os que chegavam de fora da Vila.
A residência onde iriam morar era a quarta contada de cima para baixo.
Não havia diferenças entre as casas da vila.
Com os móveis nos lugares, a roupa de cama estendida sobre o leito, as toalhas dispostas no toalheiro, parecia uma recepção em hotel, não a residência que iriam ocupar.
Havia uma ordem e limpeza digna de se ver; o capricho dos ingleses diferençava de tudo que acostumara a ver até então.
Na casa de hospedes do Morro d’Água Quente, tudo era da Companhia Inglesa, ali  a roupa de cama e mesa eram  deles, como informara Edward.
- Foi você que comprou, Eduardo?
- Lembre-se para seu próprio bem:
- Na vila você só deve falar em inglês, é uma maneira de se esforçar para aprender melhor o inglês, ainda principiante.
Magdalena lembrara que Edward tinha dito que o seu enxoval fora comprado por lady Anne Jeferre.
Ao se  encontrarem  com Mr. Cuming, a primeira coisa que ele perguntou:
- O padre vigário de Catas Altas casou vocês?
- Civilmente reverendo, apenas no civil, alegando que a benção seria dada depois do Advento.
- Não é possível!
Como se chama o reverendo?
Ele havia esquecido o seu nome e Magdalena prontificou-se a lembrá-lo:
- Padre Francisco Xavier.
- Mas ele fez isto com você, lady Magdalena?
- Infelizmente, reverendo Cuming.
- Saturday, Edward!  Saturday we will get married...
There’s nothing to be worried, you will be a married woman by Saturday.
Magdalena ficou aliviada ao saber que sábado receberia as bênçãos tão esperadas por eles.
Ainda mais, elas seriam dadas perante a comunidade que se reunia semanalmente.
Uma coisa importante eles deveriam saber:
- Quem une os casais são eles mesmos, os religiosos apenas abençoam a união, portanto Magdalena não deveria se preocupar com os rituais religiosos.
Como já havia o registro do casamento deles em Catas Altas, apenas faltava ao ato sacramental, às bênçãos de Deus que ele reverendo como todo sacerdote, tinha o poder e a missão de dar...
Tanto como os padres católicos, sou teólogo e sei o que posso ou não fazer.
Magdalena ouvia com atenção o que reverendo Cuming dizia.
- Você entendeu tudo que ele disse Magdalena?
- “Yes, now I’m calm.
Eduardo traduzia o que reverendo Cuming, falava.
A rapidez como pronunciava as palavras, não dava tempo para que Magdalena vertesse com facilidade o inglês para o português.
Aquilo seria uma constante nos primeiros tempos de contato com os ingleses.
Que alívio para Magdalena! Acabariam seus escrúpulos de estar vivendo em pecado mortal com Edward.
Um tanto envergonhada, pediu a ele para perguntar ao reverendo se poderia usar para a cerimônia a mesma veste branca  que usara em Catas Altas.
- Por que não, minha filha!
Se a veste for branca, melhor ainda, pois traduzirá  sua pureza ao se casar em sua terra, pois a cerimônia daqui será uma extensão da primeira que não foi concluída...
Com a tradução feita por Edward, ela agradeceu a compreensão do reverendo.
O cansaço da viagem a cavalo do Morro d’Água Quente até o Gongo, desapareceu com as palavras animadoras do pastor inglês.
O tempo era curto para os preparos da cerimônia que se realizaria no sábado, tendo que arranjar sua casa e atender as visitas que vinham dar as boas vindas.
Ela, Genoveva e Zaga multiplicavam-se para colocarem as coisas em seus lugares.
No Gongo o Sol aparecia mais tarde, escondido pelas montanhas e o contrário acontecia no opor, desaparecendo mais cedo.
A vila ficava dentro de um vale, abrigada por montanhas; os dias eram curtos e na noite da chegada, foram dormir cedo, cansados da marcha a cavalo.
No dia 24 de dezembro, véspera do Natal, eles estariam recuperados para a festa; a primeira depois de casados e ela longe da sua família.
O que eles não tiveram em Catas Altas, na cerimônia do casamento, a comunidade do Gongo Soco ofereceria para os noivos; um ritual ao estilo da Cornualha comemorando o Natal e um casamento de um dos seus membros.
O templo repleto em trajes de festa e todos presentes entoando hinos de louvor ao nascimento de Cristo.
A cerimônia nunca mais seria esquecida por Magdalena, pois marcara por sentimentos de fé e de solidariedade de uma comunidade desconhecida para ela.
Todo enfeitado, o templo parecia um jardim.
As laterais com os bancos repletos e apenas o centro aberto como passarela livre para que eles os noivos pudessem passar.
Oito crianças inglesas, quatro meninos e o mesmo tanto de meninas vestidas de branco, esperavam no gramado em frente ao templo, por trás deles, o reverendo Cuming e Willian Henewood aguardando os noivos que seriam levados até ao altar.
Quando o reverendo Cuming se afastava para a mina de Nova Lima, era Willian Henewood que oficiava os atos religiosas da comunidade.
Magdalena não tinha simpatia pelo inglês substituto do reverendo nos ofícios religiosos do Congo.
Ela trazida por uma charrete ornamentada de bromélias e samambaias parecia uma rainha-dos-lagos, vulgarmente conhecida por flor do aguapé.
Na porta do templo, Edward ajudou a noiva a descer e entregou-a aos braços do Comissário Mr. Duval que a levaria até ao altar.
Alas, desde o adro deixava passar o cotejo com os pajens, o comissário e os noivos.
Ao dar entrada na nave, o coro começou a cantar em inglês uma versão latina:
“Que sejas fiel à Deus.“ 
Toda a comunidade presente estava voltada para ela, que desfilava dando o braço para o comissário Mr. Duval.
Se tivessem dito para ela que a cerimônia teria aquela pompa, ela teria desistido de ser alvo de tantos olhares.
Pega de surpresa teria que desfilar airosa para não desapontar Mr. Duval e reverendo Cuming, que ordenaram a comemoração como estava se desenrolando.
Mostrando a face queimada pelo Sol, era bem diferente das demais mulheres que estavam acompanhando a cerimônia.
O mesmo vestido, a mesma coroa de virgem que Maria Theodora presenteara.
Faltava apenas a camélia que ela carregara na cerimônia de 8 de dezembro.
Falando sobre a natividade do menino Jesus, o reverendo perorou o sermão dizendo:
- A comunidade inglesa, está duplamente em festa com o nascimento do menino Deus e com a preparação do casal que aqui está para cumprir as mesmas missões de José e Maria.
As bênçãos que Edward Hosken, cidadão inglês e Maria Magdalena Mendes Campello Hosken cidadã brasileira, iriam receber,  eram também  de boas vindas da comunidade onde passaram a residir.
Convictos em  suas respectivas fés, ele em nome de Deus e perante os presentes,  abençoava o casal e os declarava unidos pelo santo matrimônio.
Você Edward Hosken, receba Maria Magdalena Mendes Campello como sua legítima esposa e você Maria Magdalena, receba sem nenhum constrangimento religioso, Edward Hosken como marido fiel e companheiro para todos os dias de suas vidas.
Deus os abençoe...
Magdalena ficara pálida, ao contrário da cor do rosto como entrara no templo.
Emocionada e trêmula, caminhara nos braços do marido inglês sem olhar para ninguém, ele calmo transpirando confiança, balançava  a cabeça em cumprimentos a seus patrícios.
Nem o coro ela ouvia, apesar de toda a comunidade entoar uma canção de Natal.
Depois do ofício natalino e das bênçãos do seu casamento, na parte externa do templo foi apresentada e recebia os cumprimentos por suas bodas e o Natal do ano de 1.848.
Ela que se sentira humilhada e infeliz no oratório católico da casa do padre Xavier, saia daquele templo de seita anglicana, feliz por ter recebido as bênçãos que não quiseram dar em sua terra.
Um Natal diferente e incomum; no adro gramado, a comunidade reunida, cumprimentava-os e felicitava-os pelas bodas matrimoniais.
Não haveria em sua vida, melhor presente do que aquele recebido em 25 de dezembro de 1.848...
O vozerio abafava o ruído do riacho encachoeirado que passava em frente do templo.
O Sol pleno queimava com toda a intensidade dos Verões brasileiros e o céu sem nuvens, mostrava aos ingleses a beleza do país em que passaram a viver.
A folhagem da mata em frente ao templo, lavada pelas constantes chuvas, mostrava-se exuberante com seus matizes do verde escuro das taiobeiras ao verde funcho das “Foeniculum vulgare.“
Como era hábito dos ingleses, no Natal as famílias reuniam-se para um jantar da comunidade ao ar livre e as comemorações iam até mais tarde.
Aquele ano de 1.848 fora pródigo para a Companhia Mineradora Inglesa, havendo por tanto, mais um motivo para o festivo congraçamento.
A adaptação para Magdalena não fora fácil nos primeiros meses de convivência, principalmente tendo que guardar tantos nomes apresentados ao mesmo tempo.
Apesar dos cumprimentos formais, ela sentia que havia interesse e sinceridade das pessoas que se ofereciam para ajudá-la.
Edward em Gongo Soco tinha com quem conversar na sua própria língua e sentia-se livre sem preocupações comuns de quem fala uma língua estrangeira; os problemas agora passaram a ser dela.
A  testa larga e lisa do marido  não franzia pensativa, como de hábito quando fumava o seu cachimbo.
Menos assediada do que ele, Magdalena notara que havia falta de moços  da sua mesma faixa etária; muitos casais mais velhos do que ela e Edward, muita criança e poucos jovens.
Os filhos mais velhos dos ingleses que vieram solteiros  da Inglaterra, tinham se  casado na própria colônia; raros como ele Edward,  haviam se casado com brasileiras.
            Passadas as festas do fim do ano de 1.848, bem como a montagem de sua casa, Magdalena tinha pouca coisa a fazer, já que Genoveva se incumbia dos afazeres domésticos.
Logo nos primeiros dias de 1.849, escreveu para a irmã Maria Rita, dizendo da sua saudade e do seu constrangimento de dirigir-se à seus pais.
Por isto escrevia para ela a irmã mais velha, pois não sabia qual seria a receptividade de sua carta na casa dos pais.
Dizia da saudade e da falta que fazia nas monótonas horas que não tinha Edward ao seu lado.
Do carinho como foi recebida na vila dos ingleses e o que era mais importante para todos, ela recebera em cerimônia especial, as bênçãos matrimoniais que deixara de receber em Catas Altas.
Que sua felicidade agora estava completa ao lado do homem que escolhera para marido, apesar das dificuldades que sentia pelo pouco conhecimento da língua falada na colônia inglesa.
Pouco a pouco, estou me tornando inglesa, tanto quanto as esposas dos outros mineradores...
A carta de Magdalena circulara nas mãos dos familiares e Maria Raymunda a outra irmã  encorajou-se em mostrá-la  à mãe.
Querendo pessoalmente ver e ler, dona Rita muita chorosa reclamava:
- Era a mim que deveria ter escrito não me conformo com mais esta indiferença!
- Não chore mãe!
- Foi a mim que se dirigiu primeiro, por não saber se a senhora acolheria uma carta dela, é isto que ela diz nesta carta...
- Não chore, mãe!
Com o tempo, tudo voltou a normalidade e se houve mal querença ou incompreensões elas foram esquecidas.
- Meu Deus!
Então ela recebeu as bênçãos matrimoniais?
- Ora mãe! Se o padre que a batizou, deu a primeira comunhão e dizia  ser seu  amigo, não quis dar as bênçãos, o marido foi buscá-la de quem era mais compreensivo nas circunstâncias; o pastor deles.
Agora a senhora poderá dormir sossegada, sua filha está casada e abençoada por Deus.
- Mas não em outra religião!
- Ora, então a senhora não queria que ela fosse abençoada?
- Não, não foi isto que eu quis dizer; eu não queria é que ela se casasse em outra igreja...
- O nosso Deus é o mesmo do marido dela, mamãe!
- Eu queria vê-la casada de véu e grinalda na igreja matriz de Nossa Senhora da Conceição...
- A senhora não pode responsabilizá-la por não ter casado na matriz,  pois era o que ela mais desejava...
- Eu sei filha, em parte sou a grande culpada...
- Nós fomos muito duros com ela!
- Deixa para lá, mãe; o que aconteceu não volta mais...
- É por isto mesmo que choro todos os dias...
Com o rosto banhado em lágrimas, Maria Raymunda procurava acalentar a mãe.
- Como irmã mais velha, eu também me sinto culpada, mãe...
- Empresta-me a carta para copiar o endereço.
Como você faz para mandar cartas para ela?
- Ainda não escrevi nenhuma, mas quando escrever vou mandar pelo correio da própria Mineradora que passa por Catas Altas toda a semana indo e voltando de Vila Rica.
- Que bom, então poderemos  manter contatos  com ela através de cartas?
Certamente que sim, vou confirmar os dias que o estafeta da Mineradora passa por Catas Altas e aviso para a senhora; John Bull representa os interesses da mineradora aqui em Catas Altas.
Passados 10 dias, Magdalena recebia no Gongo a carta da mãe abrindo o seu coração.
Com o tempo e a troca constante de correspondências, foram esquecidas todas as magoas em família.
Logo no principio do ano de 1.849, Magdalena fora convidada para dar aulas na comunidade inglesa, ao contrário de Catas Altas onde lecionara por algum tempo, ganharia da empresa um bom salário.
Para uma casa quase vazia, sòmente o casal e o filho;  Genoveva bastava para os afazeres domésticos.
Sua alegria por saber que voltaria a dar aulas contaminou a Edward na tarde de l7 de janeiro de l.848 o esposo encontrou naquela noite, uma mulher receptiva e amorosa a sua espera na porta da residência da vila.
No seu missal aberto ela rezara pelo santo do dia, Santo Antão pedindo e agradecendo as graças concedidas por ele, pois recebera a boa nova que teria dias mais ocupados a partir do primeiro dia de fevereiro. 
Logo no  princípio de fevereiro de l.849, começou a enjoar e ter náuseas por diversos alimentos.
Procurou Dr. Cuming para verificar o que era.
Achara no principio que poderia ser a água ou a comida diferente que passara a ingerir, pois a água estava turva com as chuvas.
- Você vai ser mãe, Magdalena!
Os sintomas eram todos de gravidez recente e Dr. Cuming receitou alguns remédios ingleses que ela desconhecia.
- Evite os alimentos que te faz vômitos e confira se as regras desapareceram...
Ela verificara que começara a sentir repulso por carnes e um mês depois, confirmara que a regra não viera.
Procurou o médico e pastor que se tornou seu grande amigo, informando-o que pelo segundo mês, a regra faltara e os enjôos continuavam...
Antes da Semana Santa, Magdalena recebeu um convite para passar aqueles dias junto dos pais.       
Como o convite fora feito somente a ela, Edward achara que fora  excluído;  com isto Magdalena não quis aceitá-lo.
Na carta resposta ela escreveu que na impossibilidade de ir à Catas Altas na Semana Santa, pois o tempo era curto,  que aceitaria o convite para as férias que ela teria na escola no mês de Junho, desde que sua gravidez assim permitisse.
Era uma novidade que a mãe recebera com alegria, mas não tinha certeza como seria recebida pelo marido, que ainda não perdoara a filha...
Noutra carta, a mãe fazia o convite dizendo que todos seriam bem vindos,  fazendo uma velada alusão que eles incluíam o marido e o seu filho John.
Em primeiro de Junho, toda a família, bem como Zaga e Genoveva seguiram inicialmente para o Morro d’água Quente, passando a comitiva por fora de Catas Altas.
No dia seguinte Magdalena voltou os 3 quilômetros de estrada  que os separavam da sua terra.
John havia manifestado desejo de acompanhar a madastra, mas o pai achou por bem que ele ficasse no Morro.
Foi uma festa a chegada da filha ao seu antigo lar; como se nada houvesse acontecido, ninguém tocava no assunto do casamento como ocorrera e nem parecia ter restado magoas.
O arraial estava em festas com os padres Vicentinos, missionários franceses pregando pela primeira vez no Brasil.
Eles haviam chegado á cidade do Rio de Janeiro em 9 de março daquele ano e transferidos para Mariana, até que novamente se abrisse as portas do Caraça.
Eram eles: Pedro Monteil, Tito Chalvet e José Gabert, que se juntaram ao quarto, padre Cornegliotto, todos pregando missões pelo interior de Minas.
Apesar do pouco tempo no Brasil, foram eles propositadamente lançados ao pastoreio das ovelhas, forçando-os a aprenderem mais depressa a língua portuguesa.
A Arquidiocese estava carente de padres e necessitava da catequese deles de imediato, por isto, foram jogados às feras como dizia o bispo.
Em Portugal onde estagiaram, aprenderam alguma coisa da língua, chegando ao Brasil falando sofrivelmente o idioma Camoniano com  o mesmo sotaque.
Para os missionários o mais difícil era atender as confissões,  principalmente dos humildes com um linguajar completamente diferente ao dos padres com quem estavam convivendo.
Conforme orientação do Arcebispado, eles teriam que promover uma revolução religiosa na área onde iriam pregar, pois os costumes haviam deteriorado com a invasão de forasteiros nas catas de ouro da região.
 Muitos afastados da igreja, casais vivendo em concubinato, degradação da moral familiar e um número espantoso de pagãos por falta de batismo.
Das imediações de Catas Altas começaram a vir, levas de gente, livre e escrava para serem batizadas, confessarem-se pela primeira vez, casarem-se e até mesmo  registrarem-se.
Era de se espantar a quantidade de meninos pagãos, a maioria filhos espúrios que os padres vigários recusavam batizar.
Maria Magdalena sabendo por Genoveva que John ainda não fora batizado, apesar de seus l2 anos, mandara um recado para o marido nos seguintes dizeres:
 
            Querido Edward,
                 
Chegamos a Catas Altas sob festas da família e das pessoas que me são caras.
Como o filho “ Pródigo ” retorno mais querida do que antes.
O perdão espontâneo dos meus pais, ao saberem que estamos casados religiosamente, pôs fim as mágoas de papai , já que a mamãe me havia perdoado.
Estou escrevendo-lhe para que mande o John no dia 23 de junho para ser batizado, se você assim  permitir e registrado se ainda não foi nos registros civis da comunidade do Gongo Soco.
Peço mandá-lo caso permita que seja batizado, o seu terninho branco, para a cerimônia do dia 24 de Junho.
Data consagrada a São João, padroeiro do seu nome.
Aguardo sua vinda, para percorrermos os lugares onde com muita saudade, reviveremos os melhores dias de minha vida...

                                                             Sua muito sua,

                                         Maria Magdalena Mendes Campello HOSKEN

Pela manhã do dia 23, chegou as portas da casa do Guarda-Mor, o menino acompanhado por Zaga.
A primeira impressão dos pais de Magdalena não foram favoráveis, coisa que a filha achou natural.
O menino guardava os traços da mãe, além da cor morena da fusão de 2 raças.
Se a cor não favorecia ao menino, sua maneira educada, chamava a atenção apagando a discriminação racial.
Apesar do pouco caso do Guarda-Mor pela criança, dona Rita tratava-o bem e até admirava quando ele conversava na língua paterna com Magdalena.
Todos ficavam intrigados ouvindo Magdalena dirigindo-se a ele em inglês e ele respondendo na mesma língua.
Achavam que era natural Magdalena falar o inglês, mas o garoto!
Depois de descanso da viagem, a madastra explicou a ele a importância do batismo e do registro que ele passaria a ter nos livros da igreja, deixando de ser pagão.
Desconhecendo o que era pagão, pois ninguém até então tinha se referido a aquela palavra, Magdalena teve que explicar o que significava.
- Você já foi batizada?
-Claro, logo depois que nasci, aqui mesmo em Catas Altas.
- E por que não me batizaram?
- Talvez por sua mãe ter morrido no dia que você nasceu e a outra mãe Anne  não ter se lembrado; geralmente quando a mãe ou a criança correm risco de vida na ocasião do parto, costuma-se batizar a criança para que ela não morra pagã.
Daí acharem que você já deveria ter recebido o batismo...
Neste caso, quando ocorre a emergência batismal, a criança é levada depois  para confirmação, o que não deve ter acontecido com você.
Engraçado, como é que me chamo John?
Sua mãe deve ter dado este nome a você antes que ela falecesse...
- Você conheceu minha mãe?
- Nenhuma das duas, nem Antônia, nem Anne.
- Eu me lembro da mãe Anne...
- Infelizmente não cheguei a conhecê-la apesar de gostar muito dela.
- Como gostava dela, “Sem conhece-la? “
- Foi Anne  que arranjou nosso enxoval de cama e mesa e seu pai amava-a como se fosse sua mãe...
Explicando-o que sendo mais velho e dono da sua vontade, ele poderia escolher quem quisesse ser seus padrinhos de batismo.
Poderia ser um parente mais próximo ou um grande amigo seu de preferência dentro da família.
- Você é minha parente?
- Diretamente não, indiretamente sim.
E tio Antônio e tia Antônia, lá do Morro d’água Quente, podem ser meus padrinhos?
Se eles forem cristãos batizados certamente que sim.
- Então eu vou pedir para que eles me batizem...
Se Antônia tinha por um lado a descendência direta de escravos africanos; correndo sangue dos bantos de Angola, por outro recebera o mesmo sangue dos Mendes.
No menino a mistura era brava, pois além do sangue apurado dos ingleses  de Herefordshire, havia também o sangue dos portugueses de Angola...
Com a igreja repleta de gente, os padres missionários estavam batizando mais de 30 crianças, metade delas, filhos de pai não declarado.
Entre os batizados, diversos filhos do chefe da Mina, Mr. Willian Yory Hennewood.
O inglês dirigia a mineradora com mão firme e particularmente amor; era o que constatavam os padres ao batizarem uma porção de seus descendentes nascidos no mesmo ano...
O livro de batistérios da série G-7, folhas 34 e  35... da paróquia de Catas Altas, registram seus inúmeros descendentes, mostrando como trabalhava o inglês Hennewood
 Também mostrava o batismo de: João, com aproximadamente l2 anos; nascido de Eduardo Hosken ( Inglês ) e com a cabra cativa Antônia.“
Depois da cerimônia dos batismos, Maria Magdalena e sua mãe dona Rita que também batizou várias crianças, levaram os afilhados  e os pais para o almoço de festa.
O capitão Thomé, não agüentando tanto choro e outras coisas que incomodavam o seu nariz, arranjou desculpas para cair fora, viajando para sua fazenda na Lagoa do Guarda-Mor.
Incansáveis os padres missionários atendiam aos fieis, esquecendo-se deles  mesmo.
Dando atenção aqui, uma palavra ali, os padres franceses sorriam distribuindo santinhos e medalhinhas ao povo. 
O padre José Gabert, pregando especialmente para os mineradores, empolgado com seu primeiro sermão no Brasil, esqueceu-se que estava em terras estranhas e disse em bom francês:

“ - La soit de l’or!"
     Voila le principe de tous les crimes...

Vermelho e sentindo sua gafe ao proferir as primeiras palavras em francês, consertou explicando:

    ¨O pecado mui grande, eu pode falá língua minha:
    Par qui Dieu no assusta les peuples.
    A sede do ouro é princípio dos crimes.

Ele mesmo tentando traduzir o que havia dito em francês, mais confundia os fiéis que tentavam ouvi-lo e entendê-lo.
Padre Francisco Xavier teve que remontar o sermão do colega falando:

- O reverendo missionário Gabert, quis dizer que a febre do ouro que impera por estas terras, trouxe tudo de ruim que a ambição corrompe:
A indiferença atéia, a dissolução social e o abuso do poder dos senhores donos dos escravos, querendo mais riquezas para si e as empresas que representam.
O amor aos bens materiais gera  misérias e doenças ao povo humilde e sofredor.
A população de Catas Altas é como a nossa velha igreja inacabada; uma parte brilhando no fausto do  ouro, a outra ofuscada sem vida, pois o pecado tomou conta do seu corpo,
Quantos casamentos estamos conseguindo fazer!
Quantos batizados de pagãos inocentes?
Pobre povo abandonado, buscando bens materiais dentro das minas e dos rios, esquecendo-se que o bem maior está dentro de nós mesmos:
O homem esquece os bens eternos e enfurna-se dentro da terra ou afoga-se nos rios a procura do ouro que provoca a miséria que transforma suas  vidas...
Quando padre Gabert disse em francês:

“- L’avare sacrifie l’honneux à l’interret;
    La mort ne pardonne à personne.“

Ele quis dizer que:
O avarento sacrifica a honra ao interesse; a morte que é certa a ninguém perdoa...
Quando ele apontou o assoalho da igreja mostrando os corpos aí enterrados, ele acusou também o nosso futuro destino.
Seremos o pó que o sopro da vida deixou na terra; matéria de substâncias idênticas, seja elas de: Brancos, negros, amarelos ou vermelhos.
Padre Francisco continuou explicando o sermão do padre francês a altura das compreensões dos que ouviam:
- “O povo religioso e humilde de Catas Altas vive sob o efeito da ignorância religiosa, principalmente vocês da mineração,  abandonados como estão de todos os meios de educação.
Os vícios proliferam esmagando as virtudes e os maus exemplos os descaminhos.
Poucos com tudo e muitos sem nada; a fome e a miséria são más conselheiras e campeiam soltas nas vilas e imediações das lavras.
Se os missionários que nos visitam, negarem o perdão confessional,  podem estar certos que o pecado que carregam, é bem maior que o perdão que podem dar...
Sejam vocês de agora em diante:
Freqüentes aos sacramentos, devotos em suas orações e exemplos de virtudes

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Os padres missionários e o povo descansavam aliviados da fadiga e dos pecados; Em Catas Altas não havia mais: descasados, pagãos e crianças sem registro.
Por muito tempo permaneceu na memória do povo, as missões de 1.849.
Com uma pompa exuberante,  foram encerrados os trabalhos dos lazaristas no dia da festa do Corpo de Deus.
As irmandades do Santíssimo de Santo Antônio do Rio Abaixo, São João Batista do Presídio do Morro Grande e de Catas Altas deram um brilhantismo empolgante com suas opas vermelhas, estandartes e tocheiras de prata.
O Ostensório levado sob o pálio com varas de prata era carregado pelo padre Gabert, reluzindo com todo o ouro que o Santíssimo Sacramento merece.
Antecedendo as filas das irmandades do Santíssimo, as outras confrarias desfilavam com seus estandartes e seus irmãos.
Das 2 torres da igreja matriz, os sinos dobravam puxados por mãos habilidosas improvisando sonoros repiques de festa.
As igrejas de Nossa Senhora do Rosário, Santa Quitéria e Bonfin respondiam aos dobres da matriz e os sineiros para não abafar os sons das capelas, fazia uma pequena pausa para que a manifestação da musicalidade de cada uma fosse ouvida por suas respectivas irmandades em desfile.
Vibrando com os sinos e foguetes, os padres gritavam:
- Viva o Corpo de Deus!
- Viva o novo espírito de fé!
- Viva Catas Altas e seu povo!
- Viva padre Francisco!
Respondendo ao comando dos padres missionários a multidão repetia:
- Viva! Vivô! O Espírito Santo chegou...
Se o júbilo do povo era contagiante, o dos missionários era indescritível, sem voz para gritarem...
Quem mais apreciara os festejos, foi o enteado de Maria Magdalena, ele nunca tinha visto uma festa tão bonita e tanta gente junta.
A felicidade do menino transbordava por seus sorrisos; o casamento do pai dera a ele uma família que ainda não tivera.
Tia Bonifácia também hospedada com a cunhada naqueles dias, achara o “bacurí “uma gracinha, dizendo:
- Cumé que um menino tão pequeno pode falar outra língua estrangeira?
   O mundo está mesmo virando de perna pro ar!
Menino forte, roliço, cara de traquina; tal como desejava para todas as suas crias na Fazenda da Cachoeira.
Ah, se encontrasse crias como aquela!
John entusiasmou-se com os carinhos de Sá Bonifácia que dizia pare ele:
- Vou levar você para morar comigo, para você mostrar para meninada da Cachoeira como os meninos devem ser...
Magdalena ria com a conversa de Bonifácia e respondia:
- Ele agora é meu tia Bonifácia! O primeiro presente que o Edward me deu....
- Ou filha! Quando vi este meninão com a cabeça sobre a pia do batismo, tomando toda a água pela cabeça, fiquei com medo dele falar um nome feio para o padre...
Fosse um dos meus nesta idade teria mandado o padre para aquele lugar...
Os parentes que enchiam a casa do Guarda-Mor começaram a voltar na manhã de sexta-feira para suas casas nos retiros e fazendas.
O cansaço e o enfado dominavam a todos...
Quem levantara mais cedo naquela manhã, pode ver a comitiva dos padres missionários a caminho do Caraça.
Os pregadores iriam conhecer o famoso colégio que estava fechado desde o período da revolução e posteriormente iriam assumir a sua administração.
De lá retornariam á Mariana.
As férias de Magdalena e John chegaram ao fim, principalmente para ela que voltara a sentir o gosto da casa paterna; o carinho dos pais, irmãos e escravos, além das amigas de quem havia se separado.
Como eram diferentes os dias passados em Catas Altas,  em contrapartida aos  que passava em sua casa em Gongo Soco.
Arrumando as malas, mãe e filha choravam pela separação.
- Volta rápido, filha!
Seu pai não anda bem de saúde...
- Como posso voltar com este barrigão, mãe!

Veja se na próxima, traga também o seu marido; é preciso que se acabe o mal estar que separa seu esposo do Thomé...
- Fique tranqüila, mãe!
Tudo farei para por fim as indiferenças.
A senhora não sabe o quanto sofro sem a presença dele aqui!
As diferenças entre o sogro e o genro, jamais seriam  esquecidas plenamente.
Acho que Deus me castiga por tudo de errado que fiz.
Purgo meus pecados!
Depois das Missões, ninguém tem mais pecados a pagar filha...
No dia 28 de junho, véspera da festa de São Pedro e São Paulo, Magdalena voltou para Gongo Soco.
Edward estava a sua espera na casa dos ingleses  no arraial do Arranca Toco, próximo ao Brumado.
Lá encontrariam e seguiriam juntos passando por São Bento,  São João do Morro Grande e Socorro.
Edward notara que apesar de triste, Magdalena estava mais bonita e especialmente carinhosa; ele não sabia se: Saudosa da presença dele, ou se a estadia junto dos pais, fora a causa de sua transformação.
- Mamãe me pediu que transmitisse a você seus cumprimentos e fosse portadora de uma mensagem de paz entre você e papai, pois da parte dela, não havia nenhuma magoa.
- Sua mãe é  uma mulher sensível Magdalena, além de figura excepcional!
- Papai também é Edward!
- Ele é tão, como fala: “headstrong“.
- Turrão, obstinado...
- Isto, tur turrão como eu, ele deve estar menos raiva de eu...
- Mamãe contou para ele como recebemos as bênçãos lá  em Gongo Soco; ela disse que ele se mostrou aliviado.
Aquela tarde noite véspera de São Pedro e São Paulo, fora uma das melhores de suas vidas; novamente estavam juntos depois que se separaram pela primeira vez após o casamento.
Ambos demonstraram quanto era gostoso e importante estarem juntos...
Às horas insones da madrugada revelara o quanto fizera bem a distância e a saudade.
As noites frias de junho, apesar de serem mais longas, passavam rápidas para o casal em sua 2a. Lua de Mel.
Havia por parte dela a espontaneidade e satisfação da entrega, sem nenhum constrangimento; o prazer era participativo ao contrário de outros tempos, onde se rendia quase só ao prazer dele...
 As manhãs no pequeno arraial do Arranca Toco eram frias e preguiçosas, Magdalena acordava tarde embalada pelo cantar da passarinhada e depois do café da manhã, saia com o John caminhando pêlos campos.
Algumas vezes iam até ao Sumidouro atravessando com os pés descalços o frio rio Caraça e chegavam até a capelinha onde ela orava contrita; uma vez ou outra, os padres do colégio do Caraça vinham rezar missa na capelinha da baixada.
Missa certa aos domingos era rezada na igreja de Santo Amaro no Brumal, ou na fazenda do Engenho, mas todas duas ficavam muito longe para assisti-las.
Ao lado de Edward, a vida era doce e a espera dele todas as tardes dava um sabor do saciar da sede; era necessário vivê-la como Deus estava presenteando....
Na primeira manhã de hospedagem no arraial do Sumidouro, acordara com a voz de Genoveva brigando com a menina Aparecida.
Ao levantar Magdalena perguntou à Genoveva, porquê brigavam?
- A fia da mãe pede benção como se eu fosse mãe dela!
- Que tem isto, Genoveva!
É uma maneira educada e respeitosa como trata as pessoas mais velhas...
- Oia, Nhá! Sou sorteira e sem fio, nu acarrego curpa de muié imbigada com mancancro!
- Que é mancancro, Genoveva?
- Gente ordinaia, fia!
- Não pense assim dos outros, Genoveva!
Além de falta de caridade, é pecado e maledicência...
A negra estava azeda, pois, ficou relegada perdendo a festança que o menino contara para ela.
No dia 30, voltaram para a serra do Gongo Soco, terminando os dias mais gostosos que, Magdalena e Jonh passaram juntos.
 Decorreram sete meses após casamento e dentro dela já existia a sementinha que Edward lhe dera...
Dona Rita aconselhara a filha a procurar o Dr. Moreira.
- Não é necessário, mãe!
Dr. Cuming já me examinou lá em Gongo Soco...

Naquele Julho de 1.949, voltava Magdalena de Catas Altas para o Gongo Soco com Edward, quando no caminho a eles se juntou um cavaleiro austríaco alto e de porte nobre que viera para o Brasil, como oficial militar da embaixada de seu país;  acompanhava-o uma comitiva de cavaleiros.
Intrigado com aquela cavalhada do estrangeiro europeu viajando por terras brasileiras, ele Edward apresentou-se e perguntou:
- Senhor! Certamente sois estrangeiro como eu; Não é?
- Sim, sou austríaco e há muitos anos vim para o Brasil a serviço como adjunto militar da embaixada de meu país; meu nome é José Maria Brüzzi e atualmente estou levantando dados para os prezados amigos e ex-companheiros  revolucionários:  Feliciano Pinto Coelho da Cunha e o ex deputado provincial mineiro, o senhor Theófilo Otoni.
- Então o caminheiro está se dirigindo a Nossa Senhora Rainha do Caeté?
- Como sabes?
- Não é lá que reside o Dr. Feliciano, também meu amigo?
- Oh! Que bela coincidência, vou a sua procura e a seu chamado.
- O que o senhor faz atualmente senhor Brüzzi?
- Nada ou quase nada, pois fui guindado a síndico das obras da arquiconfraria do Cordão de São Francisco em Santa Bárbara e vou pedir ao deputado para interceder junto do senhor bispo de Mariana para que conceda  licença das obras de renovação e ampliação da capela da qual sou o responsável.
Então seremos companheiros de viagem e com o mesmo destino...
Foi assim o início de uma amizade que duraria por muitos anos; Inicialmente em Santa Bárbara, depois em Catas Altas do Mato Dentro, onde passaria a morar o capitão José Maria Brüzzi...
O austríaco apesar de seu porte físico e airoso mancava em uma das pernas que recebera um tiro na campanha da revolução CONSTITUCIONALISTA de 1.842; o amigo de José Feliciano Pinto Coelho da Cunha, não era nem mineiro e nem brasileiro, porém lutou pela liberdade constitucionalista do povo com quem passara a viver e a respeitar. 

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